Muitos antes de o homem pensar em Deus, ele já estar no pensamento de Deus. Antes mesmo de o convertido clamar a Deus, Deus já o tem atraído pelo o Espírito Santo. Paulo escreve este esforço de Deus, nas seguintes e sublimes palavras: “e sabemos que todas as coisas contribuem juntamente para o bem daqueles que amam a Deus, daqueles que são chamados por seu decreto. Porque os que dantes conheceu, também os predestinou para serem conformes à imagem de seu Filho, a fim de que ele seja o primogênito entre muitos irmãos. E aos que predestinou, a esses também chamou; e aos que chamou, a esses também justificou; e aos que justificou, a esses também glorificou” (Rm 8.28-30).
1. A Presciência de Deus
“presciência” é o aspecto da onisciência relacionado com o fato de Deus conhecer todos os eventos e possibilidades futuros. No que diz respeito à salvação, a presciência de Deus não afeta as decisões do homem, nem o seu livre arbítrio. As ações de um homem não são permitidas ou impedidas simplesmente porque são previstas ou conhecidas de antemão, por Deus. No Novo Testamento, o termo “presciência” aparece, inclusive com conceitos paralelos, nos seguintes textos: Romanos 3.25; Atos 26.5; Romanos 8.29; 11.2; 1 Pd 1.20; 2 Pd 3.17; Atos 2.23 e 1 Pd 1.2. Estas passagens destacam três importantes fatos relacionados com o conceito de “presciência”. Primeiramente significa de fato “saber alguma coisa de antemão”. Alguns estudiosos da Bíblia negam que esta palavra envolva conhecimento, e então alegam que significa “amor de antemão”, porque conhecer pode ser usado como uma expressão correspondente, para amar. Entretanto quando a mesma palavra grega é usada em casos não-teológicos, esses mesmos estudiosos nunca interpretam o termo por “amor de antemão. Por exemplo, em Atos 26.5, o termo se refere a homens que conheciam a reputação de Paulo muito antes da sua chegada a Roma; e em 2 Pedro 3.17 a palavra é usada para designar um conhecimento prévio acerca dos falsos mestres.
2. A Eleição Divina
A palavra “eleição” no contexto da doutrina da salvação, não significa que Deus escolheu alguns para serem salvos e outros para a perdição, sem qualquer participação da pessoa nessa escolha. No que diz respeito à salvação, eleição é a escolha de Deus de algumas pessoas para a salvação e privilégios, baseada na escolha inicial feita Por essas mesmas pessoas. Atentemos para o que diz o apóstolo Paulo: “como também nos elegeu nele antes da fundação do mundo, para que fôssemos santos e irrepreensíveis diante dele em caridade” (Ef 1.4). Deste modo o “mérito” de sermos escolhidos não se baseia em nós mesmos, mas no “mérito” de estarmos em Cristo. Assim como estamos “em” Cristo, assim também fomos feitos dignos de sermos escolhidos (eleitos) por Deus. A maior dificuldade em entender a eleição está no fator tempo. Daí a frequência com que surge a seguinte pergunta: “se a pessoa é ‘eleita’ antes de lançados os fundamentos da terra, como, pois, a eleição pode ser baseada na fé em Cristo?” Pedro responde a esta pergunta, dizendo o seguinte: “eleitos segundo a presciência de Deus Pai, em santificação do Espírito, para a obediência e aspersão do sangue de Jesus Cristo” (1 Pd 1.2). Baseado no seu conhecimento quanto à decisão que o crente tomaria, Deus o elegeu, antes mesmo de lançados os fundamentos da terra.
3. A Predestinação
A doutrina da predestinação é uma das mais consoladoras doutrinas da Bíblia. Sua essência repousa no fato de que Deus tem um plano geral e original para o mundo, e que seus propósitos jamais serão frustrados. Negativamente analisada, certamente que a predestinação não é uma manipulação da parte de Deus das escolhas do homem. Isto o rebaixaria à posição de um fantoche, sem poder de escolha nem vontade. A predestinação nunca predetermina as escolhas dos homens, mas, sim, preordena as escolhas de Deus no que concerne ao seu relacionamento com as inclinações, necessidades e escolhas dos homens. Sabendo de todas as possibilidades futuras, bem como os corações dos homens, Deus fez um plano dos seus atos: atos estes que resultarão em maior glória para Deus, na salvação do maior número de pecadores, e que contribuirão com o desenvolvimento da mais perfeita obediência de seus servos (Rm 8.28,29).
A fim de entender a predestinação, é necessário distinguir entre predestinação e fatalismo. Fatalismo é uma crença herética que atribui as ações e escolhas do homem ao “determinismo” de Deus. Ou melhor, Deus decide o que o homem será e fará. Mediante o planejamento predeterminado por Deus (a predestinação), a salvação é oferecida a todas as pessoas (At 4.27,28) e é possível a todos quantos buscam a Deus (At 17.26,27).
Por causa desta provisão, nenhuma pessoa poderá, em qualquer tempo, acusar Deus de não lhe ter dado oportunidade para crer e se salvar (Rm 1.20). Deus não apenas planeja uma maneira de todos os povos conhecerem a salvação, como também tem um plano para ajudar os crentes a progredirem na sua vida espiritual. “Também os predestinou para serem conforme a imagem de seu Filho” (Rm 8.29). Este plano, no entanto, depende da disposição do crente de corresponder em obediência a Deus (Jr 15.19). Deus “nos predestinou para ele, para adoção de filhos, por meio de Jesus Cristo” (Ef 1.5). Fomos “predestinados… a fim de sermos para louvor da sua glória, nós, os que de antemão esperamos em Cristo” (Ef 1.11,12).
4. O Chamamento
Deus jamais força alguém a aceitá-lo, mas certamente convida todos os homens a receberem a salvação. Para isto Deus dispõe da sua graça e do poder do Espírito Santo. Os atos de graça, mediante os quais Deus concede a salvação e ajuda o homem a alcançá-la, são conhecidos como “chamamento de Deus” (Rm 8.28). É importante compreender que o chamamento de Deus para a salvação, é tanto universal quanto irresistível. Há três argumentos nas Escrituras quanto ao chamamento universal de Deus aos homens para a salvação. São eles: Deus deseja que todos os homens sejam salvos (2 Pd 3.9) mas não obriga o homem a aceitar a salvação, quer o homem queira, ou não. Os crentes são conclamados a “proclamar” o evangelho ao mundo inteiro e a “persuadir” os homens a aceitá-lo (Mt 28.19; 2 Co 5.11). A natureza universal do chamamento de Deus é revelado no “convite da Escritura”. Lendo passagens como João 3.16; Isaías 55.1 e Mateus 11.28, notamos que o convite para a salvação não é seletivo, mas sim, coletivo, para todos quantos o atenderem. Não obstante o chamamento de Deus seja dirigido a todos os homens, ele pode ser rejeitado (Jo 5.40; At 7.51; Rm 10.21; Hb 10.29). O fato do chamamento de Deus ser universal não faz a salvação um fato incondicionalmente universal. Assim como a redação através de Cristo é suficiente para todas as pessoas, mas eficazmente para o que crê, assim também a chamada de Deus é válida para o mundo inteiro, mas aplicável unicamente àqueles que a atendem.
5. Cooperação Com Deus na Salvação
Quanto à doutrina da salvação, existem hoje duas correntes de interpretação: uma comprometida com o “determinismo”, e a outra com o “livre arbítrio”.
a) O Determinismo
O cristão determinista crê que Deus predeterminou de antemão os salvos e os perdidos, independentemente da escolha humana. A salvação, portanto, é uma consequência inteiramente da graça de Deus. Neste caso, a fé é expressa, não como uma decisão da parte do crente, mas, sim, como uma resposta à irresistível atuação de Deus sobre o espírito do homem. Quanto aos predestinados á perdição eterna, segundo o determinismo, embora querendo ser salvos, lhes é negado este direito. Vieram ao mundo, podem ouvir a pregação do evangelho, porém jamais se salvarão, uma vez que Deus decretou de antemão a perdição deles.
b) O Livre Arbítrio
Segundo esta corrente de interpretação, todos os tratos de Deus com o homem, inclusive a eleição e a predestinação, estão baseados nas decisões que o homem toma, uma vez que é um agente livre para aceitar ou rejeitar o dom de Deus. Mais que isto, todos os homens têm igual oportunidade de buscar a Deus, ouvir o evangelho, se arrependerem de seus pecados e serem salvos.
c) Cooperando Com a Salvação
Os defensores do determinismo estão equivocados quando salientam demasiadamente a verdade da majestade, da graça e do poder de Deus, em detrimento da insuficiência do homem para fazer qualquer coisa sem o auxilio divino. Ignoram a capacidade de decisão do homem quanto à determinação do seu futuro eterno. De igual modo os defensores do livre arbítrio correm o risco de enfatizar a livre agência do homem, reduzindo a fé a um ritual sem vida, levando o cristão a uma obediência apenas à letra do evangelho, esquecendo-se do poder de Deus operante na sua vida. A salvação, como experiência prática, só é possível com a cooperação do crente. Quanto a isto diz o apóstolo Paulo: “de sorte que, meus amados, assim como sempre obedecestes, não só na minha presença, mas muito mais agora, na minha ausência, assim também operai a vossa salvação com temor e tremor; porque Deus é o que opera em vós tanto o querer como o efetuar, segundo a sua boa vontade” (Fp 2.12,13).